Vania Curiati é diretora de parceiros comerciais e alianças da IBM desde julho de 2013. Entre suas principais missões está a de fortalecer o relacionamento da gigante de computação com revendas, integradores e distribuidores e unificar a estratégia de canais – além, é claro, de estimular a migração desses parceiros para uma oferta de soluções, deixando para o passado o estigma de vendedores de caixas.
Membro do Conselho de Canais de Vendas e Distribuição do Brasil e colunista do Portal do Canal, Vania recebeu o CEO do Grupo Direct Channel, Pedro Luiz Roccato, para uma conversa franca sobre tendências tecnológicas e canais de venda e distribuição. E salientou: ainda há um longo caminho a percorrer.“Já chegamos lá? Estamos no mundo ideal? Não. Sempre falo que estamos longe, para sempre colocar a régua sempre para cima. É uma jornada, e não tão fácil assim.”
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Roccato: Há um desafio nos canais que é o movimento do produto para a solução. Em que estágio eles estão? E em que pé está a reegenharia da operação da IBM para alcançar este alinhamento?
Vania Curiati: Essa movimentação de produto para solução não é algo novo. Vem dos últimos três, quatro anos. Claramente o mercado vem comprando soluções, não mais produtos. O que a IBM fez, primeiramente, foi um trabalho com os parceiros internos para identificar quais teriam maturidade para a venda de soluções. São aqueles que já vendiam produtos, mas com serviços agregados. Quem já tinha o cacoete de serviços acaba tendo mais facilidade de adotar o discurso de solução. Mesmo os parceiros de hardware, tão focados em produtos. No primeiro momento selecionamos quase 170 parceiros de hardware, de um total de 300 ativos, que teriam condições de vender soluções. Veio a ideia de que 100% deles pudessem também vender soluções cloud, da Softlayer, que a IBM comprou em 2013, para que tivessem a capacidade de pró-ativamente colocar uma venda on premisses de infraestrutura ou cloud com soluções da Softlayer. Esse foi o primeiro movimento que fizemos porque o mercado já estava exigindo isso.
Roccato: E depois?
Vania: Segundo foi ver entre aqueles que já vendiam serviços de infraestrutura quais outras soluções poderiam ser aderentes e complementares. Segurança por exemplo que tem muita a ver com infraestrutura. Quem tinha um NOC [Network Operations Center, ou centro de operação de rede] está preparado para vender um SOC [Information Security Operations Center, ou ISOC]? Ele acaba tendo habilidades parecidas e de fácil conversão e introdução dentro da equipe técnica do parceiro. Este é um exemplo. E logicamente os parceiros de software, que eram single solution. Por exemplo: aquele que vendia puramente colaboração não quer adequar e vender segurança? Muitas vezes esses parceiros dizem “ok, mas não quero ter essa expertise dentro de casa”, então começamos a fazer as conexões, “parceirizações”, e aí surge o papel fundamental do distribuidor em ajudar na conexão para que eles possam complementar as soluções do cliente.
Roccato: E qual o número de parceiros de software no total do programa e quantos participaram do movimento?
Vania: Esse movimento é total. Hoje são cerca de 650. Eles são 100% soluções, não tem como não ser. Eles têm que participar. O go-to-market varia muito de empresa para empresa. Alguns estão totalmente prontos, já vendendo, parceirizados, com harware e software vendendo soluções. E outros que só agora falaram “é mesmo, preciso vender soluções”.
Roccato: Nessa linha do go-to-market e do ponto focal que vai trabalhar em termos de influenciadores e decisores, o histórico dos canais é conversar com os departamentos de TI. Software está em outro passo, mas ainda com viés muito técnico. Como você tem ajudado os canais a mapear os pontos focais além da TI e ter um discurso alinhado aos negócios?
Vania: Treinamento. Disponibilização de informação. Os distribuidores estão ajudando também com isso. Temos buscado, por meio de algumas metodologias importadas, de trazer esse conhecimento para dentro dos parceiros. Mesmo alguns parceiros de software sabem vender muito bem a parte técnica, mas não conseguem trabalhar com o diretor industrial para dizer realmente o que há de vantagem para o negócio dele. A gente tem buscado deixar o nosso time de vendas mais próximo do ecossistema para ajudá-los com esse conteúdo. Eu diria que essa movimentação do produto para a solução não é particularidade dos parceiros, mas de todas as empresas de tecnologia, incluindo a IBM. Estamos investindo massivamente nos nossos vendedores na venda de soluções de indústria. É uma mudança total de conhecimento e cultura dos nossos funcionários e parceiros. Já chegamos lá? Estamos no mundo ideal? Não. Sempre falo que estamos longe, para sempre colocar a régua para cima. É uma jornada, e não tão fácil assim.
Roccato: Quando falamos em desenvolvimento de mercado, há uma necessidade de falar de valor propriamente dito, e não de produto. Tenho percebido que principalmente os canais de hardware resistem. Cloud, por exemplo, ele ainda vê como ameaça, não oportunidade. Quando falamos de linhas de negócio o distanciamento é ainda maior. Como tem sido a resposta aos treinamentos nesse sentido?
Vania: Varia muito. Tem parceiro que abraça pois vê realmente como oportunidade para se reposicionar no mercado. E outros que não. Que continuam vendendo infraestrutura e tudo bem. Ele quer ser um parceiro que vende dessa forma. Perfeito. A gente só mostra que tem todo um outro mercado em que ele poderia estar ganhando muito mais, inclusive em termos de aumento de margem, porque vai se diferenciar do concorrente e aumentar lucros.
Roccato: Quando você fala de um contato direto, acredito que a IBM visite o cliente final com o canal. Como fica este modelo híbrido de operação e política comercial? Há clareza quando a IBM faz uma venda direta e quando isso é desenvolvido pelo canal?
Vania: Hoje no nosso programa de canais, na maior parte dos territórios, nossos vendedores só são remunerados se a venda for via canal. Isso faz com que o próprio vendedor queira atrair o parceiro. Ficou muito claro no Partner World [evento global de canais da empresa] que uma das estratégias mundiais da IBM é o ecossistema e a formação correta para atuar com as nossas soluções. Nosso ecossistema tradicional e um novo, que é a solução da IBM dentro da solução do parceiro.
Roccato: Olhando tendências de mercado, varejo por exemplo, em que muito se fala de experiência do consumidor. Como você vê a conexão entre as soluções IBM e o Brasil? Como você vê o nível de aplicação e preocupação dos varejistas brasileiros?
Vania: Todos os varejistas brasileiros estão falando de transformação digital. Ela passa obrigatoriamente pelo uso de tecnologias. Temos alguns parceiros que estão se especializando justamente nessa área. Seja simplesmente na loja, para que ela seja digital. A BR Mania, dos postos Petrobras, por exemplo. O maior lucro de um posto está na loja, pois na gasolina as margens são muito pequenas. São os serviços que o posto proporciona que dão a lucratividade. WiFi, painéis digitais, cardápio digital. A atratividade é outra. Muda-se o público, que fica mais exigente, mas também consome mais. Você já vê lojas com iPads, por exemplo. Ou identificando o cliente assim que ele entra e dando opções de atendimento personalizado. Começa-se a criar um relacionamento muito mais personalizado e isso já é uma realidade no Brasil. Nesse momento de crise você vê uma preocupação dos varejistas em se diferenciar, buscando coisas simples como entender que estão falando dos seus produtos nas redes sociais. Tivemos o caso da Hyundai nos EUA que no Super Bowl fizeram todo o trabalho com computação cognitiva, utilizando o Watson, de qual seria o formato do anúncio, o ator mais adequado, tudo em cima de uma análise nas mídias sociais. E eles tiveram um recorde de vendas e visitas nas concessionárias depois desse trabalho. Foi feito o mesmo tipo de trabalho por uma marca de automóveis no Brasil, que fez um pré-lançamento nas mídias sociais e depois uma análise em que perceberam que o produto iria fracassar. Com isso fizeram mudanças no modelo do carro para que fosse mais atraente e viram que havia também um problema de percepção de marca no mercado brasileiro. Houve um trabalho de marketing da marca para retirar essa percepção.
Roccato: Como é que você vê as oportunidades de Internet das Coisas (IoT)? Como você vê essa conexão em termos de tecnologia e o movimento dos canais?
Vania: Recentemente tivemos um parceiro específico em sensores. Ele começou a ver que só estava instalando sensores, mas não ofertando valor. Era só uma commodity. Ele falou “quero dar mais valor para o cliente, sair do preço”. Começamos a fazer um trabalho com eles para que tivessem uma camada de serviços analíticos e criar uma inteligência de captura de dados, e até criar dashboards para endereçar soluções end-to-end para o cliente. Por outro lado, temos parceiros que tinham capacidade analítica enorme, mas não tinha conexão com empresas de sensores. Então fizemos essa conexão para que pudessem ter soluções completas. Temos que buscar essa conexão para o parceiro de forma que esteja pronto para a venda de soluções. O papel do fabricante e do distribuidor é fundamental.
Roccato: Como mensagem final para canais e os leitores?
Vania: Nós IBM estamos ávidos por novos parceiros. Ano passado foram mais de 100 novos cadastrados, 100% voltados a soluções. Temos um pipeline maior ainda para este ano. Estamos totalmente abertos a entender o momento do negócio. Não queremos que você mude qualquer plataforma que tenha hoje, mesmo que da concorrência. Hoje o portfólio de produtos que a IBM tem faz a atratividade dos parceiros seja sempre complementar. Em um momento de crise, nada como vender uma nova solução na sua própria base de clientes.
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